Disponível em: https://www.amazon.com.br/dp/B0DDK19V7V
Espaço inicialmente reservado a produções relacionadas a meu Mestrado em Memória Social e Bens Culturais, Lasalle, 2012. Depois, em boa parte, direcionado a pesquisas vinculadas ao Doutorado em História Social, USP, 2017. Atualmente (2019), dará lugar a publicações conexas a meu pós-doc em Psicologia Social junto à UERJ, com estágio concluído em 2023. Além disso, contempla temas como memória, história, arquivos pessoais, cotidiano, arte, fotografia e outros saberes.
segunda-feira, 19 de agosto de 2024
JEANNE DES ANGES E A POSSESSÃO DEMONÍACA EM LOUDUN: Psicologia Coletiva e o contágio emocional no século XVII
sexta-feira, 9 de agosto de 2024
A Sociedade do Espetáculo: uma análise comparativa entre Debord e Baudrillard
A obra "A Sociedade do Espetáculo", de Guy Debord, publicada em 1967, é considerada uma das mais influentes análises críticas da sociedade contemporânea. Nela, Debord desenvolve uma perspectiva radical sobre a dominação da vida social pela lógica da mercadoria e da imagem, fenômeno que ele denomina "espetáculo". Essa análise encontra ressonância em diversos temas abordados pelo sociólogo Jean Baudrillard, que também se debruçou sobre a crescente centralidade da imagem e do simulacro na sociedade pós-moderna.
O ponto de partida de Debord é a constatação de que "toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos". Essa "acumulação de espetáculos" reflete a separação entre a realidade vivida e sua representação, de modo que "tudo o que era diretamente vivido se afastou em uma representação". Nessa perspectiva, a vida social é cada vez mais mediada por imagens e simulacros, que se autonomizam e se tornam a realidade dominante.
Essa dinâmica de separação e autonomização da imagem em relação à realidade vivida é um tema central também na obra de Baudrillard, para quem a sociedade contemporânea é marcada pela proliferação de signos e simulacros que se descolam de qualquer referente real, constituindo uma "hiper-realidade" que suplanta a própria realidade. Assim como Debord, Baudrillard identifica nesse processo uma forma de dominação social, na medida em que a "hiper-realidade" do espetáculo e do simulacro se impõe como a realidade dominante.
Outro ponto de convergência entre os dois autores é a crítica à mercantilização da cultura e da vida social. Tanto Debord quanto Baudrillard apontam para a transformação da cultura em mercadoria, processo que Debord denomina "a cultura tornada integralmente mercadoria". Nesse contexto, a própria imagem se torna uma mercadoria a ser consumida, em um movimento de "consumpção espetacular" que conserva a cultura do passado de forma congelada e descontextualizada.
No entanto, apesar dessas convergências, é possível identificar algumas diferenças importantes entre as abordagens de Debord e Baudrillard. Enquanto Debord mantém uma perspectiva ancorada na teoria marxista, com ênfase na luta de classes e na possibilidade de uma transformação revolucionária da sociedade, Baudrillard adota uma postura mais pessimista e niilista, enfatizando a impossibilidade de qualquer forma de resistência efetiva diante da onipresença do simulacro. Para Debord, a dominação do espetáculo é inseparável da lógica da mercadoria e do desenvolvimento do capitalismo, e só pode ser superada por meio da ação revolucionária do proletariado. Já Baudrillard parece ver o simulacro como uma condição inescapável da sociedade contemporânea, sem vislumbrar qualquer possibilidade de transformação radical.
Essa diferença de perspectiva se reflete também na forma como cada autor aborda a questão da alienação. Debord concebe a alienação como um processo histórico e social, resultado do desenvolvimento do capitalismo e da lógica da mercadoria, passível de superação pela ação revolucionária. Para ele, a alienação não é uma condição permanente, mas algo passível de superação pela ação revolucionária do proletariado, que pode romper com a dominação do espetáculo. Ou seja, Debord mantém uma visão dialética, acreditando na possibilidade de transformação histórica.
Já Baudrillard tende a ver a alienação de forma mais pessimista, como uma condição ontológica da existência humana na era do simulacro. Para ele, a proliferação dos signos e imagens descolados da realidade cria uma "hiper-realidade" que suplanta a própria realidade, tornando a alienação uma condição inescapável. Baudrillard não vislumbra caminhos claros para a superação dessa alienação, adotando uma postura mais niilista.
Portanto, a divergência entre Debord e Baudrillard quanto à concepção da alienação está intimamente ligada a suas diferentes perspectivas sobre a possibilidade de superação da dominação do espetáculo e do simulacro na sociedade contemporânea
Apesar dessas divergências, é inegável a importância e a atualidade das análises de Debord e Baudrillard para a compreensão da sociedade contemporânea. Ambos os autores contribuíram de forma decisiva para a crítica da dominação da imagem, da mercadoria e do espetáculo, fenômenos que se tornaram cada vez mais centrais na organização da vida social nas últimas décadas. Nesse sentido, a comparação entre as perspectivas de Debord e Baudrillard pode lançar luz sobre as complexidades e contradições da sociedade do espetáculo, abrindo caminhos para uma compreensão mais profunda de seus mecanismos de dominação e das possibilidades de sua superação.