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segunda-feira, 2 de junho de 2025

Gustav Le Bon

Gustave Le Bon (1841–1931) foi um pensador francês cuja obra influenciou profundamente o entendimento moderno sobre o comportamento coletivo, as crenças e o poder das ideias. Médico de formação, Le Bon logo se dedicou mais à pesquisa do que à prática clínica, migrando de áreas como fisiologia e anatomia para a antropologia e, finalmente, para a psicologia social.

Sua obra mais célebre, Psychologie des foules (1895), introduz o conceito de "foule psychologique" — a multidão psicológica. Para Le Bon, uma multidão não é apenas uma reunião de indivíduos, mas sim um ente coletivo com uma mentalidade própria. Nessa condição, o indivíduo perde sua consciência e senso de responsabilidade, tornando-se mais influenciável, impulsivo e emotivo. As multidões operam por meio de contágio mental, que induz à imitação irracional, sugestão, comparável ao hipnotismo, e um sentimento de poder invencível, gerado pelo anonimato e pelo número.

Le Bon propôs que o ser humano não age apenas por lógica racional, mas por diferentes formas de lógica: racional — baseada em razão e análise; afetiva — guiada por sentimentos, muitas vezes inconscientes; mística — baseada em crenças e fé; coletiva — surgida em grupo, combinando lógica afetiva e mística; biológica — instintiva, base da existência humana.

Para Le Bon, a história das civilizações é movida não por razão, mas por ideias fundamentais que se tornam crenças. Crenças, ao contrário do conhecimento racional, são aceitas como verdades a priori. Ele destaca que a necessidade de crer é tão fisiológica quanto o prazer ou a dor, e que dogmas destruídos são sempre substituídos por outros.

As massas não raciocinam — imaginam. São impressionáveis, crédulas e suscetíveis a imagens fortes, simplificadas e simbólicas. Por isso, um grande crime ou uma grande vitória causa mais impacto do que centenas de pequenos eventos. O orador que deseja influenciar deve usar afirmações enfáticas, repetição e prestígio pessoal.

Le Bon antecipou conflitos mundiais, o avanço das ditaduras, a propagação do socialismo e até a ressurreição do Islã político. Para ele, a razão pouco explica os grandes feitos históricos: “Deixemos a razão aos filósofos, mas não esperemos muito dela no governo dos homens.”(Psychologie politique, 1911, p.67)

A influência de Le Bon chegou até os fundadores da psicanálise. Segundo Wilhelm Steckel, no livro Infantilismo psicosexual: enfermedades psíquicas infantiles en los adultos, Freud considerava a obra Psicologia das Massas como um texto padrão, que o ajudou a esclarecer suas próprias ideias sobre a dinâmica do inconsciente coletivo. Le Bon via a massa como o retorno ao primitivo, ao irracional, onde o indivíduo perde sua identidade consciente e passa a agir de forma impulsiva e inconsciente. A responsabilidade se dilui, surgem o contágio psíquico e a figura essencial dos líderes. (Steckel, s.d., p. 522)

Le Bon teve enorme reconhecimento em vida, mas seu pensamento é hoje alvo de críticas — especialmente por supostos traços elitistas, racistas e conservadores (Taguieff, 1998). Seu impacto, no entanto, é inegável. É frequentemente citado como influência em líderes como Hitler e Mussolini, embora essa conexão seja controversa. Seu legado permanece como um marco no estudo do comportamento coletivo e político.

Referências

Touret, D. (n.d.). Le Bon. Recuperado em 2 de junho de 2025, de http://www.denistouret.fr/ideologues/Le_Bon.html

Rouvier, C. (1986). Les idées politiques de Gustave Le Bon (Préface d’Edgar Faure). Paris: Presses Universitaires de France.

Taguieff, P.-A. (1998). La couleur et le sang: Doctrines racistes à la française. Paris: Mille et une nuits.

Steckel, W. (s.d.). Infantilismo psicosexual: enfermedades psíquicas infantiles en los adultos (p. 522). Buenos Aires: Ed. Íman.

Le Bon, G. (1894). Les lois psychologiques de l'évolution des peuples. Paris: Félix Alcan.
Le Bon, G. (1895). Psychologie des foules. Paris: Félix Alcan.
Le Bon, G. (1896). Psychologie du socialisme. Paris: Félix Alcan.
Le Bon, G. (1911). Les opinions et les croyances. Paris: Flammarion.
Le Bon, G. (1931). Bases scientifiques d'une philosophie de l'histoire. Paris: Flammarion.

terça-feira, 2 de abril de 2019

Carta de Henri Bergson a Gustave Le Bon


Leon Dauded (1923, setembro 14), na época em que era diretor político do nacionalista e antirrepublicano L'Action française, que circulou de 1906 a 1944, publicou um virulento artigo onde acusou Henri Bergson de parvoíce, utilizando-se de uma carta que este último escrevera a Gustave Le Bon, a propósito da obra Le déséquilibre du monde publicada naquele mesmo ano. Na carta, Bergson, embora questione o pessimismo de Le Bon, reconhece a considerável contribuição que ele teria aportado na fundação da psicologia coletiva.
Eis o documento traduzido na íntegra:

Escrevo-vos para dizer com que interesse li “O desequilíbrio do mundo”. O livro não é encorajador, ah, não! Não se poderia traçar um quadro mais impressionante das dificuldades da hora presente e da aparente impotência dos homens para superá-las. Não se poderia, não mais, mostrar com mais força a principal causa dessa impotência, que é o desconhecimento das condições materiais e morais da vida dos povos. O amanhã será bom, com efeito, para a psicologia coletiva, esta ciência para a qual tanto haveis contribuído para fundar. Resta saber se vós não levastes o pessimismo um pouco longe. Na raiz de vossa argumentação, eu creio perceber a ideia de que a humanidade não muda, de que os esforços que ela parece fazer há alguns anos para se modificar, para se “racionalizar” estão condenados à impotência: sois severo, por exemplo, para com a Sociedade das Nações. Estimo, aliás, como vós, que a humanidade não mudou até aqui senão bem pouco e muito lentamente. Mas quem sabe um grande esforço de vontade realizado em condições materiais inteiramente novas não daria resultados muito mais rápidos e consideráveis! Limito-me a colocar a questão. Não gastamos muito tempo lendo-vos, porque vosso livro (e este é o maior elogio que se pode fazer a um livro) obriga o leitor a pensar.
Deixai-me, caro amigo, endereçar-vos meus cumprimentos, com a expressão de meus sentimentos afetuosos.

Henri Bergson
da Academia Francesa

Referência: Bergson, H. (1923, setembro 14). Carta a Gustave Le Bon. In: Dauded, L. (1923, setembro 14). La nouvelle ídolo: Bergson-Nigaudinos. L'Action française : organe du nationalisme integral, ano 16, n. 256, Paris: capa.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Lei da unidade mental coletiva


Na primeira parte de sua obra clássica intitulada “Psicologia das multidões”, Gustave Le Bom (1909, p. 12) emprega, com grifos, aliás, essa expressão: lei da unidade mental das multidões. A tal lei estariam submetidas as multidões, eis que formariam um único ser, porque, — dirá ele —, em determinadas circunstâncias, e apenas nessas certas circunstâncias, — acentua —, uma aglomeração humana adquiriria características novas, que se mostrariam muito diferentes daquelas particulares aos indivíduos que compusessem a aglomeração. Suas personalidades conscientes como que se desvaneceriam, enquanto seus sentimentos e ideias se orientariam rumo a uma mesma direção. Formar-se-ia assim “uma alma coletiva, transitória sem dúvida, mas apresentando características muito nítidas” — afirma, acrescentando a seguir que, na ausência de expressão mais adequada, haveria aí uma multidão organizada, ou, preferindo-se, “uma multidão psicológica” (id. Ibid.).

Fonte: Le Bon, G. (1909). Psychologie des foules. Paris: Alcan.



sexta-feira, 30 de março de 2018

Sobre a fabricação do papel


Encontrei em Gustave Lebon (1884) interessantes referências sobre a fabricação do papel. Sabe-e que, na Idade Média, o suporte para escrita era o pergaminho, cujo custo elevado[1] fazia com que, frequentemente, os monges raspassem as obras dos grandes escritores gregos e romanos para sobre elas gravarem suas homilias. A difusão dos saberes reclamava, pois, a utilização de um substrato, análogo ao papiro egípcio, capaz de substituir o pergaminho, prestando assim um grande serviço à difusão dos saberes. Para Le Bon, os árabes foram os primeiros a fazerem essa substituição, o que se comprovaria pela descoberta, por Casiri, na biblioteca do Escorial[2], de um manuscrito árabe assentado sobre papel de algodão que remonta a 1009, anterior, portanto, a todos aqueles existentes nas bibliotecas da Europa. Reconstituindo o caminho histórico dessa invenção, Le Bon faz lembrar que os chineses, desde tempos imemoriais, dominavam a fabricação de papel a partir de casulos de seda, fabricação introduzida em Samarcanda[3] nos primeiros tempos da hégira e, quando os árabes se apoderaram dessa cidade, aí teriam encontrado uma fábrica já instalada. A utilização da preciosa descoberta, todavia, encontrava obstáculo na Europa, onde a seda era pouco ou quase desconhecida. A solução seria substituí-la por outra substância, o quer fora feito pelos árabes, que empregaram o algodão. Dever-se-ia também aos árabes a descoberta do papel de trapos, de difícil fabricação, exigindo numerosas manipulações, porque o emprego deste tipo de suporte entre os árabes é muito anterior ao uso que os povos cristãos fizeram dele. Afirma Le Bon que o documento considerado como o mais antigo manuscrito sobre papel existente na Europa é uma carta de Joinville a São Luiz escrita pouco antes da morte deste príncipe em 1270, ou seja, em época superior à sua primeira cruzada no Egito. Todavia, haveria manuscritos árabes sobre papel de trapos anteriores em mais de um século a este documento, notadamente um tratado de paz firmado entre Afonso II de Aragão e Afonso IV de Castilla, que data de 1178 e que se conserva nos arquivos de Barcelona. Sua origem será a celebra fábrica de papel de Xatiba, da qual o geógrafo Edrisi[4], que escreveu na primeira metade do século XII, fala com elogio.
Fonte : LE BON, Gustave. La civilisation des Arabes, Livre VI : La décadence de la civilisation arabe. Paris : Firmin-Didot, 1884. Édition réimprimée à Paris en 1980 par Le Sycomore, Éditeur, 1980.
Imagem: Fragmento de antigo tecido árabe de acordo com desenho do egiptólogo Prisse d'Avesne. 


[1] Lembro-me bem de ter ouvido em minhas aulas de paleografia medieval que seria necessário o couro de não menos de cem vacas para dar contas de uma bíblia.
[2] Real Biblioteca del Monasterio de San Lorenzo de El Escorial.
[3] Segunda maior cidade do Uzbequistão e capital da província de Samarcanda. A palavra significa "Forte de Pedra" ou "Cidade de Pedra" em sogdiano. Fonte : Wikipédia
[4] Abu Abdulá Maomé Idrissi (1099-1165), também conhecido como Idrissi, Xarife Idrissi ou simplesmente Edrisi ou Idris ou, ainda, pelo nome latino de Dreses, sendo também referido na literatura como o Árabe da Núbia,foi um geógrafocartógrafo e botânico árabe, famoso pela qualidade de seus mapas, tanto no desenho quanto na precisão. Fonte : Wikipédia