Por sua singularidade, o arquivo de Lysia não se presta a
uma função sistemática, exceto aquela que, no passado, lhe imprimiu sua
empreendedora e que persiste ainda em sua organicidade[1].
A questão, parece, poderia estar relacionada ao que Baudrillard observou com
relação ao objeto marginal e ao objeto antigo, que escapariam a qualquer
sistematização. Singulares, barrocos, folclóricos, exóticos, antigos ― enumera
ele ― tais objetos contradiriam exigências de uma ordem funcional e
responderiam a desejos de outra ordem: testemunho, lembrança, nostalgia,
evasão. “Esses objetos ― acrescenta ― por diferentes que eles sejam, também
fazem parte da modernidade, e tomam aí um duplo sentido” [BAUDRILLARD,
Jean. Le système des Objets. Paris: Gallimard, 1968, p. 103]. Isso
ocorreria, particularmente, quando viessem a integrar um sistema cultural
diferente daquele que lhes deu origem. Passariam assim a responder a outras
necessidades, num processo equivalente à supressão do tempo, ao menos na ordem
do imaginário.
[1] “Organicidade é o termo que designa,
na área arquivística, a qualidade segundo a qual os arquivos refletem a
estrutura, funções e atividades da entidade acumuladora, em suas relações internas
e externas” (CAMARGO, Ana Maria de Almeida. Os arquivos e o acesso à verdade. In:
SANTOS, Cecília MacDowell et al.
(org). Desarquivando a ditadura: memória
e justiça do Brasil. São Paulo: Hucitec, 2009a, v.2, p.424-443).
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