"Vivemos
num mundo em que os Estados ameaçam com o terror, exercitam-no e às vezes o
sofrem. É o mundo de quem procura se apoderar das armas, veneráveis e potentes,
da religião, e de quem empunha a religião como uma arma. Um mundo no qual
gigantescos Leviatãs se debatem convulsamente ou ficam de tocaia, esperando. Um
mundo semelhante àquele pensado e investigado por Hobbes.
Mas
alguém poderia sustentar que Hobbes nos ajuda a imaginar não só o presente,
como também o futuro: um futuro remoto, não inevitável, e contudo talvez não
impossível.48 Suponhamos que a degradação
do ambiente aumente até alcançar níveis hoje impensáveis. A poluição do ar, da água
e da terra acabaria por ameaçar a sobrevivência de muitas espécies animais,
inclusive aquela denominada Homo sapiens
sapiens. A essa altura, um controle global,
minucioso, sobre o mundo e seus habitantes se tornaria inevitável. A sobrevivência
do gênero humano imporia um pacto semelhante àquele postulado por Hobbes: os
indivíduos renunciariam às próprias liberdades em favor de um super Estado opressor,
de um Leviatã infinitamente mais potente que os passados. O grilhão social
estreitaria os mortais num nó férreo, já não contra a “ímpia natureza”, como
escrevia Leopardi em La Ginestra [A
giesta], mas em socorro a uma natureza frágil, deteriorada, precária.
Um
futuro hipotético, que esperamos não se verifique jamais."
GINZBURG, Carlo. Medo, reverência, terror. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. Disponível em: < https://pt.scribd.com/document/233115318/Carlo-Ginzburg-Medo-Reverencia-e-Terror >. Acesso em: 09/10/2016.
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