"Entre a espécie microbiana e a espécie humana existe simbiose total e incompatibilidade radical. Não podemos dizer que o outro homem seja micróbio — jamais se opõem em sua essência nem se confrontam —; encadeiam-se, e este encadeamento está como que predestinado. Ninguém, nem o homem nem o bacilo, pode pensá-lo de maneira diferente. Não existe uma linha fronteiriça, uma vez que este encadeamento repercute ao infinito. Ou, em tal caso, há que se tomar a decisão de afirmar que a alteridade está aí: o Outro absoluto é o micróbio, em sua inumanidade radical, aquela de que nada sabemos e que sequer é diferente de nós. A forma oculta que tudo altera, e com qual não há negociação nem reconciliação possível. E, sem embargo, vivemos da mesma vida que ela e, enquanto espécie, morrerá ao mesmo tempo que a nossa — seu destino é o mesmo —. É como a história do verme e da alga: o verme alimenta em seu estômago uma alga sem a qual nada pode digerir. Tudo vai bem, até o dia em que o verme imagina devorar sua alga: devora-a, mas morre (sem nem sequer havê-la digerido, uma vez que ela já não pode ajudá-lo)."
BAUDRILLARD, Jean. La transparencia del mal. Ensayo sobre los fenómenos extremos. Tradução de Joaquín Jordá. Barcelona: Anagrama, 1991, p. 173-4.
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