Dentre os que procuraram estudar
a psicologia coletiva, parti de quem a teria nomeado e definido como elo entre a psicologia,
voltada ao estudo do indivíduo, e a sociologia, voltada ao estudo da sociedade.
Trata-se de Enrico Ferri (1856-1929). Detalhe: a nomeação e a definição de psicologia coletiva constam da segunda edição de uma obra voltada ao Direito, e ao Direito Penal, mais
especificamente ainda ao processo penal: I
nuovi orizzonti del Diritto e della Procedura penale (Nicola Zanichelli,
1884). Só posteriormente, em nova edição publicada na França, esta mesma obra aparece com o título: La Sociologie Criminelle
(1914).
A nota da edição francesa destaca que as atividades manifestadas por um grupo de
homens não se confundem com as atividades manifestadas por uma sociedade
inteira. Isso sugeria, para Ferri, que poderia haver um elo entre a psicologia
e a sociologia, elo que ele batiza como psicologia
coletiva, voltada ao estudo de grupos de indivíduos que podem se
apresentar reunidos em caráter acidental ou permanente. O campo de observação
da psicologia coletiva, para Ferri, estaria voltado àquelas reuniões de caráter
mais ou menos adventício, que ele mesmo exemplifica, citando vias públicas,
marchas, bolsas, oficinas, teatros, comícios, assembleias, colégios, escolas,
casernas, prisões, etc.
Este batismo da psicologia coletiva é reivindicado pelo
próprio Ferri em correspondência que manteve com Scípio Sighele (1868-1913), correspondência
esta publicada na França, em 1901, na obra, tornada clássica, intitulada La foule criminelle.
Essai de psychologie collective.
Possível também a conferência in loco
desta reivindicação: "A psicologia coletiva, – como eu a batizei
desde a 2ª edição de Nuovi orizzonti, – recebeu uma organização muito vigorosa
pelos estudos geniais, e com justiça louvados, de meu muito querido amigo
Sighele" (SIGUELE, 1901, p. 177).
Portanto,
seguindo estas pistas deixadas por quem reivindica ter sido o primeiro a nomear esse “elo”, temos que Ferri não a chamou de ciência, talvez porque ainda não tivesse suas leis adequadamente
identificadas e estabelecidas. Emprego esse mesmo termo leis, porque era uma expressão comum utilizada pelos praticantes
das ciências que exibiam então, no XIX, seu caráter experimental em oposição ao
metafísico do qual era preciso afastar-se nesses tempos de fin de siècle.
A propósito desse quem é quem da psicologia coletiva, destaco a importância de dois autores italianos, Ferri e Sighele, e não há
como deixar de citar também um autor francês que não mereceu, da parte de Sighele, a
mesma menção gratidão que este último debitou a Gabriel Tarde (1843-1904) e a Victor
Cherbuliez (1829-1899). É que no prefácio de La foule criminelle. Essai de psychologie collective,
tais autores foram identificados como aqueles que
“longa e lealmente” teriam discutido a teoria de Sighele. Gustave Le Bon é citado e Sighele reconhece sua importância, não obstante deixe claro tratar-se de um autor que
teria feito uso de suas observações sem citá-lo, todavia. E diz mais: que não havia ironia
nesse agradecimento, porque a adoção de suas ideias sem qualquer menção a sua
pessoa seria “o gênero de elogio menos suspeito que nos pode ser endereçado”.
De
qualquer sorte, os trabalhos de Gustave Le Bon (1841-1831), mormente sobre a
psicologia das multidões, tiveram grande repercussão, talvez porque sua
linguagem bem como a clareza com que posicionava do ponto de vista social e político
permitisse ampla popularização de suas ideias. Na mesma esteira, embora mais
tarde e fora do eixo Itália e França, Ortega y Gasset (1883-1955) com sua La rebelión de lãs masas (1930) pode e deve ser lembrado, especialmente pelo fato de contribuir para a popularização dessas ideais, na linha da temibilidade das multidões e das massas, conceito que adquiria cada vez mais consistência.
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